DISSIDIO COLETIVO - ACORDO / CONVENÇÃO Objeto

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TST - Maria de Assis Calsing



RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO PELO SINDICATO DOS COMERCIÁRIOS DE SÃO PAULO. DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA. CLÁUSULA QUE LIMITA O FUNCIONAMENTO DAS EMPRESAS A DOIS DOMINGOS POR MÊS. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. 1. Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica que tem por objeto a análise acerca da "inconstitucionalidade, ilegalidade e ineficácia" da cláusula de Convenção Coletiva de Trabalho que fixa o funcionamento dos estabelecimentos comerciais em apenas 2 domingos mensais. 2. A declaração de não conformidade da cláusula ao arcabouço jurídico, todavia, não se insere no escopo do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica. Note-se, ainda, que, em última análise, o efeito prático aqui almejado é a alteração do teor da norma em convergência com o interesse das Suscitantes. Por mais legítimo ou razoável que seja esse interesse, bem delineado, inclusive, na proposta para negociação formulada no bojo da representação, não é aqui o meio adequado para alcançá-lo. 3. O Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica está vocacionado a apurar o sentido e/ou alcance da norma, solvendo o ponto dúbio, obscuro ou contraditório que compromete a sua compreensão e sua plena eficácia. No caso, o que move as Suscitadas é a certeza jurídica sobre a restrição do alegado direito, prevista na cláusula acordada pela entidade sindical que as representa, e que vai de encontro aos seus interesses. Processo extinto, sem resolução de mérito, por inadequação da via eleita. Recurso Ordinário a que se dá provimento.



RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO PELO SINDICATO DOS COMERCIÁRIOS DE SÃO PAULO. DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA. CLÁUSULA QUE LIMITA O FUNCIONAMENTO DAS EMPRESAS A DOIS DOMINGOS POR MÊS. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. 1. Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica que tem por objeto a análise acerca da "inconstitucionalidade, ilegalidade e ineficácia" da cláusula de Convenção Coletiva de Trabalho que fixa o funcionamento dos estabelecimentos comerciais em apenas 2 domingos mensais. 2. A declaração de não conformidade da cláusula ao arcabouço jurídico, todavia, não se insere no escopo do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica. Note-se, ainda, que, em última análise, o efeito prático aqui almejado é a alteração do teor da norma em convergência com o interesse das Suscitantes. Por mais legítimo ou razoável que seja esse interesse, bem delineado, inclusive, na proposta para negociação formulada no bojo da representação, não é aqui o meio adequado para alcançá-lo. 3. O Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica está vocacionado a apurar o sentido e/ou alcance da norma, solvendo o ponto dúbio, obscuro ou contraditório que compromete a sua compreensão e sua plena eficácia. No caso, o que move as Suscitadas é a certeza jurídica sobre a restrição do alegado direito, prevista na cláusula acordada pela entidade sindical que as representa, e que vai de encontro aos seus interesses. Processo extinto, sem resolução de mérito, por inadequação da via eleita. Recurso Ordinário a que se dá provimento. RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO PELO SINDICATO DOS CONCESSIONÁRIOS E DISTRIBUIDORES DE VEÍCULOS NO ESTADO DE SÃO PAULO – SINCODIV. LITISCONSORTE NECESSÁRIO. PREJUDICADO O EXAME DO APELO. Conquanto não invocada a preliminar de mérito relativa à inadequação da via eleita pelo Sindicato patronal, a decisão do capítulo anterior, no que extinguiu o processo, sem julgamento de mérito, afeta todo o feito. Trata-se, no caso, de litisconsórcio necessário-unitário, pois, dada a comunhão de interesses de ambas as entidades sindicais (profissional e econômica), que compõem o polo passivo da demanda, na interpretação e manutenção da cláusula impugnada, não há possibilidade de haver, em tese, duas decisões conflitantes. Significa dizer: é inviável, à luz da segurança jurídica e eficácia da norma coletiva, ter como harmônica a decisão que extingue o processo com outra que eventualmente julgue o mérito, quando é mútua a relação de direitos e obrigações fixadas entre as Partes. Prejudicado o exame do Recurso Ordinário. (TST-RO-285-94.2012.5.02.0000, Maria de Assis Calsing, DEJT, 20.09.13).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário n.º TST-RO-285-94.2012.5.02.0000, em que são Recorrentes SINDICATO DOS CONCESSIONÁRIOS E DISTRIBUIDORES DE VEÍCULOS NO ESTADO DE SÃO PAULO - SINCODIV e SINDICATO DOS COMERCIÁRIOS DE SÃO PAULO e são Recorridas SPG DISTRIBUIDORA DE VEÍCULOS LTDA. E OUTRAS.

R E L A T Ó R I O

A SPG Distribuidora de Veículos Ltda. e Outras 12 Empresas ajuizaram Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica em desfavor das categorias profissional e econômica representadas pelo Sindicato dos Comerciários de São Paulo e Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos no Estado de São Paulo – SINCODIV, tendo como objeto a cláusula 56.ª da Convenção Coletiva de Trabalho 2011/2012, firmada entre os Suscitados a fls. 728/784 (numeração do processo principal), que versa sobre autorização do trabalho em domingos e feriados. Postulam, liminarmente, seja reconhecido o direito de funcionamento das Empresas suscitadas todos os domingos do mês, o que abrange as respectivas filiais, todas estabelecidas e sediadas na cidade de São Paulo e, por fim, a ratificação dessa medida, caso infrutífera a negociação proposta na representação.  

Liminar deferida a fls. 942/944, a fim de assegurar às Suscitantes o direito de funcionamento de todas as suas concessionárias de veículos em todos os domingos, observado o limite de 2 (dois) domingos por mês por empregado e as demais regras previstas na cláusula 56.ª da Convenção Coletiva de Trabalho em questão.

Por meio da Decisão proferida nos autos do Mandado de Segurança n.º 000570-87.2012.5.020000, a fls. 954/955, foi cassada a referida liminar. Posteriormente, foi cancelada a distribuição do Mandado de Segurança à Seção Especializada em Dissídios Coletivos, para determinar nova distribuição ao Órgão Especial, que deferiu, nos mesmos termos, a liminar outrora deferida, a fls. 1.825/1.826.

Ata da Audiência a fls. 1.235/1.236.

Defesas apresentadas pelo Sindicato dos Comerciários de São Paulo, a fls. 1.252/1.279, e pelo Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos no Estado de São Paulo, a fls. 1.315/1.336.

Pedido de antecipação dos efeitos da tutela, formulado no curso do processo pelas Suscitantes, deferido, a fls. 2.008/2.013.

Réplica a fls. 2.041/2.079.

Ata da nova audiência, realizada em virtude do pedido de reconsideração do pedido de antecipação de tutela, a fls. 2.144/2.149, em que consignada a suspensão dos efeitos da medida.

Parecer da Procuradoria Regional do Trabalho da 2.ª Região pela extinção do processo, sem resolução de mérito, ou, caso superada a preliminar, pela improcedência do pedido, a fls. 2.152/2.159.

Pedido de reconsideração da suspensão dos efeitos da tutela antecipada, a fls. 2.161/2.181, que foi indeferido a fls. 2.611.

O Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região, mediante acórdão a fls. 2.652/2.681, rejeitou as preliminares suscitadas pelos Suscitados e restabeleceu a tutela antecipada, de forma a assegurar às Suscitantes o direito de funcionar todos os domingos, observando, contudo, as folgas de dois domingos por mês, alternados, mediante escala, sob pena de multa. No mérito, declarou ser inaplicável "às empresas suscitantes a limitação quanto ao funcionamento de suas lojas a base de dois domingos por mês. As empresas suscitantes têm o direito de exercer a sua atividade econômica em todos os domingos do mês, contudo, devem resguardar o direito dos seus empregados a duas folgas por mês de forma obrigatória aos domingos, adotando-se a escala domingo sim domingo não".

Mediante acórdão a fls. 2.946/2.959, o Tribunal Regional da 2.ª Região julgou os Embargos de Declaração e decidiu acerca de incidentes apresentados pelas Partes.  

O Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos no Estado de São Paulo interpõe Recurso Ordinário a fls. 2.965/2.980.

O Sindicato dos Comerciários de São Paulo também apresenta Recurso Ordinário, a fls. 2.983/2.996.

Despacho de admissibilidade a fls. 3.000/3.001.

Contrarrazões apresentadas a fls. 3.007/3.045.

Os autos não foram encaminhados à Procuradoria-Geral do Trabalho, nos termos do art. 83 do RITST.

É o relatório.

V O T O

CONHECIMENTO DOS RECURSOS ORDINÁRIOS

O Recurso Ordinário interposto pelo Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos no Estado de São Paulo é tempestivo (acórdão proferido no julgamento dos Embargos de Declaração publicado em 20/8/21012, conforme certidão lavrada a fls. 2.960, e Apelo interposto em 28/8/2012), regular a representação (procuração a fls. 1.396) e custas recolhidas, a fls. 2.981.

Regular, igualmente, o Apelo apresentado pelo Sindicato dos Comerciários de São Paulo, em 28/8/2012. A procuração encontra-se a fls. 1.281 e o substabelecimento a fls. 1.280. As custas foram recolhidas a fls. 2.998.

Conheço de ambos os Apelos.  

MÉRITO DOS RECURSOS ORDINÁRIOS

RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO PELO SINDICATO DOS COMERCIÁRIOS DE SÃO PAULO

INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA – PRELIMINAR DE MÉRITO REITERADA NAS RAZÕES DO APELO

O Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região rejeitou a preliminar de inadequação da via eleita suscitada em defesa. Valeu-se, para tanto, dos seguintes fundamentos:

"02.1. Cabimento do dissídio coletivo de natureza jurídica.

 O dissídio coletivo de natureza jurídica objetiva a interpretação de uma norma jurídica existente, que pode ser uma lei de aplicação particular de determinada categoria, uma convenção coletiva; um acordo coletivo, um contrato coletivo ou uma sentença normativa

 A presente ação objetiva que seja analisada o teor da cláusula 56 do instrumento normativo da categoria. A OJ 7 da SDC do Tribunal Superior do Trabalho estabelece que:

‘Não se presta o dissídio coletivo de natureza jurídica à interpretação de normas de caráter genérico, conforme o disposto no art. 216, II, do RITST’.

Não serve o dissídio coletivo de natureza jurídica para a interpretação de normas genéricas, como é o caso de dispositivos legais.

A rigor, não é o caso dos autos a aplicação da OJ O7 do TST.

Nos presentes autos, o que temos é a interpretação de uma cláusula normativa, a qual é possível de ser efetuada, de acordo com a doutrina, bem como em face do que consta da inteligência do art. 216, II, do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho.

Não se pode esquecer que o dissídio coletivo de natureza jurídica é um procedimento de conhecimento do tipo declaratório.

Visa tão somente estabelecer o alcance de uma norma jurídica da categoria. Vale dizer, não cria e nem estabelece novas cláusulas ou condições de trabalho."

Busca o Sindicato profissional demonstrar que o objeto da presente demanda escapa ao escopo do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica e requer, por inadequação da via eleita, a extinção do processo sem resolução de mérito.

À análise.

O Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica tem por finalidade buscar o sentido e o alcance de determinada normal legal, convencional ou sentença normativa destinada a certa categoria. O provimento jurisdicional a ser alcançado por tal via tem natureza meramente declaratória, pois sua vocação não vai além de precisar a exata interpretação da norma preexistente, dela eventualmente afastando qualquer obscuridade ou dubiedade em seu sentido, que possa dificultar sua plena aplicação.

No caso concreto, as Suscitantes não têm dúvida quanto ao sentido e alcance da norma impugnada. Sabem elas que a clausula 56.ª da CCT limita o funcionamento dos estabelecimentos comerciais a apenas 2 domingos mensais. A pretensão deduzida consiste, pois, na declaração de "inconstitucionalidade, ilegalidade e ineficácia" da cláusula. Assim, a par da proposta feita na representação para que haja negociação, a fim de assegurar a todos os empregados das concessionárias o direito a ter dois descansos semanais coincidentemente com os domingos, controlados por escalas, postularam as Suscitadas, com destaque no original:

"c) Na hipótese da Negociação restar Infrutífera que esta C. Corte proceda na interpretação e análise jurídica da cláusula 56.ª da Convenção Coletiva de Trabalho firmada entre as Entidades Sindicais Suscitadas, reconhecendo, ao final, a inconstitucionalidade, ilegalidade e ineficácia da previsão contida no parágrafo 2.º, que prevê a limitação do funcionamento das lojas das Suscitantes a apenas 2 (dois) domingos mensais;"

Toda a argumentação expendida na representação converge coerentemente para o quanto postulado.

Com efeito, as Suscitadas alegaram que houve tentativa de negociação prévia à instauração de instância com as entidades sindicais convenentes, "visando proceder a revisão do teor da cláusula em comento, ou renegociar seus termos" (a fls. 15). Invocaram consequências nocivas decorrentes do teor da cláusula existente, como possíveis desempregos, diminuição nos postos de trabalho, sujeição das empresas à vontade das entidades convenentes, etc.

Ao definir o conteúdo da presente Ação, afirmaram que: "O objeto do conflito coletivo é a previsão contida na cláusula 56.ª da Convenção Coletiva de Trabalho firmada entre as Suscitadas, que estabelece, de forma expressa, a proibição do funcionamento das concessionárias de veículos a 2 (dois) domingos por mês, havendo inclusive, tabela fixando as restritivas datas" (a fls. 19, conforme original).

Eis o teor da cláusula, no que aqui importa:

"CLÁUSULA QUINQUAGÉSIMA SEXTA - AUTORIZAÇÃO DO TRABALHO EM DOMINGOS E FERIADOS.

Fica autorizada a prestação de serviços facultativos dos comerciários abrangidos por esta convenção coletiva em domingos e feriados com fundamento no artigo 6.º e seu parágrafo único, da Lei federal n.º 10.101/2000 e posteriores alterações e acréscimos da Lei n.º 11.603/2007, das Leis Municipais n.ºs 13.473/2002 e 14.776/2008 e respectivos Decretos n.ºs  45.750/2005 e 14.776/2008, que regulamentam O trabalho em domingos e feriados e a concessão de licenciamento para funcionamento nestes dias mediante certidão, desde que observadas e cumpridas as condições desta cláusula, resultantes de negociações coletivas entre as partes signatárias aprovadas em respectivas assembleias.

Parágrafo Primeiro - O trabalho em domingos e feriados limitado a oito horas normais diárias será facultativo, sempre condicionado à vontade do trabalhador, devidamente registrada em lista previamente assinada por EMPREGADOS que concordarem, com as respectivas identificações individuais (nomes e números da CTPS) e juntada em comunicação dos CONCESSIONÁRIOS que pretenderem utilizar as condições desta cláusula, a ser protocolada no SINDICATO, ficando vedada a convocação compulsória do trabalho nestes dias, sem observância das suas condições.

Parágrafo Segundo - O trabalho em domingos e feriados autorizado nesta convenção coletiva a partir de l.º de janeiro de 2012, somente poderá ser convocado e realizado, após cumpridas as exigências do parágrafo anterior e desde que observado o limite obrigatório de apenas dois domingos mensais, fixado em assembleia regional dos CONCESSIONÁRIOS e identificados no quadro a seguir, conforme pesquisa autorizada e realizada pelo SINCODIVSP junto a todos estabelecimentos cadastrados na categoria econômica patronal, sediados na base territorial sindical do SINDICATO, para todos os fins e efeitos de direito:

 

MÊS

DATAS

 

ORDEM DOS DOMINGOS

JANEIRO

15/01/2012

29/01/2012

3.º e 5.º

FEVEREIRO

12/02/2012

26/02/2012

2.º e 4.º

MARÇO

11/03/2012

25/03/2012

2.º e 4.º

ABRIL

15/04/2012

29/04/2012

3.º e 5.º

MAIO

13/05/2012

27/05/2012

2.º e 4.º

JUNHO

17/06/2012

24/06/2012

3.º e 4.º

JULHO

15/07/2012

29/07/2012

3.º e 5.º

AGOSTO

12/08/2012

26/08/2012

2.º e 4.º

SETEMBRO

16/09/2012

23/09/2012

3.º e 4.º

OUTUBRO

21/10/2012

28/10/2012

3.º e 4.º

NOVEMBRO

11/11/2012

25/11/2012

2.º e 4.º

DEZEMBRO

09/12/2012

16/12/2012

2.º e 3.º

 

Parágrafo Terceiro - Qualquer alteração na autorização do trabalho nas datas ou ordem dos dois domingos mensais fixados no parágrafo segundo desta cláusula dependerá de aditamento à presente convenção firmado entre o SINDICATO e o SINCODIV-SP.

.............................................................................................................."

A cláusula é extensa e nela foram fixados vários comandos.  Entre todos, somente com relação à limitação do funcionamento das concessionárias a dois domingos mensais se insurgem as Suscitadas, a pretexto de se tratar de restrição ilegal e inconstitucional. E, é nessa perspectiva, que seguem os demais argumentos. 

A declaração de não conformidade da cláusula ao arcabouço jurídico, todavia, não se insere, definitivamente, no escopo do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica.

Note-se, ainda, que, em última análise, o efeito prático aqui almejado é a alteração do teor da norma em convergência com o interesse das Suscitantes. Por mais legítimo ou razoável que seja esse interesse, bem delineado, inclusive, na proposta para negociação formulada no bojo da representação, não é aqui o meio adequado para alcançá-lo.

Reprise-se que o Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica está vocacionado a apurar o sentido e/ou alcance da norma, solvendo o ponto dúbio, obscuro ou contraditório que compromete a sua compreensão e sua plena eficácia.

No caso, o que move as Suscitadas é a certeza jurídica sobre a restrição do alegado direito, prevista na cláusula acordada pela entidade sindical que as representa, e que vai de encontro aos seus interesses.

O Tribunal Regional andou mal, portanto, ao formar juízo de valor acerca dos argumentos expendidos pelas Suscitadas e, nessa esteira, proferir decisão que escapa ao conteúdo declaratório a que, inclusive, reconheceu como ínsito à espécie.  

Colhem-se, a título ilustrativo, precedentes em que analisado o cabimento do Dissídio de Natureza Jurídica instaurado com propósitos alheios ao seu fim:

 

"RECURSO ORDINÁRIO EM DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA. PEDIDO DE REALIZAÇÃO DE INSPEÇÃO JUDICIAL E DE DECLARAÇÃO DE ILEGALIDADE DE REMUNERAÇÃO APÓS O FIM DA VIGÊNCIA DE ACORDO COLETIVO DE TRABALHO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. O dissídio coletivo de natureza jurídica volta-se à interpretação de cláusulas de sentenças normativas, de instrumentos de negociação coletiva, acordos e convenções coletivas, de disposições legais particulares de categoria profissional ou econômica e de atos normativos. Postulações de realização de inspeção judicial, bem como de declaração de ilegalidade de remuneração praticada pela Empresa após a vigência de acordo coletivo de trabalho, não constituem dúvida de interpretação de normas específicas vigentes entre as partes, o que refoge ao objeto do Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica. A pretendida regularização de remuneração de empregados após a vigência de acordo coletivo de trabalho que, conforme reconhece expressamente o Suscitante, dispõe exatamente no sentido contrário do que ora almeja refoge ao âmbito do dissídio coletivo de natureza jurídica, constituindo, se for o caso, matéria para nova negociação coletiva e dissídio coletivo de natureza econômica, oportunidade para a Justiça do Trabalho manifestar-se sobre a controvérsia. Firmada esta premissa, não subsiste a determinação do Tribunal Regional do Trabalho no sentido de remessa dos autos a uma das Varas do Trabalho de São José dos Campos, pois a inadequação da via eleita recebe o tratamento dispensado à carência de ação. Recurso Ordinário a que se dá provimento para declarar extinto o processo, sem resolução de mérito." (Processo: RO-10259-66.2010.5.15.0000, Relator: Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro, DEJT 26/3/2013.)

"DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. O dissídio coletivo de natureza jurídica tem como finalidade específica interpretar e declarar o alcance de cláusulas de sentenças normativas, de instrumentos de negociação coletiva, acordos e convenções coletivas, de disposições legais atinentes à categoria profissional ou econômica e de atos normativos. Na hipótese, o que busca a Suscitante, por meio de dissídio coletivo de natureza jurídica, não é a mera interpretação de sentença normativa, mas a transformação do aumento linear de R$ 80,00 (oitenta reais) para toda a categoria em aumento percentual. Assim, a pretensão da CNPL detém caráter nitidamente econômico, de cunho condenatório, no sentido de impor à ECT o pagamento de reajuste salarial diferenciado para os profissionais liberais, com alteração de regra normativa estipulada na decisão judicial anterior. O pedido é, no fundo, de revisão do reajuste salarial deferido no item XI da parte dispositiva da sentença normativa questionada. Nessa medida, verifica-se que este dissídio coletivo não se classifica como jurídico, pois a Suscitante não pretende a interpretação da sentença normativa, mas sim reajuste salarial diferenciado para os profissionais liberais com nível de qualificação mais elevado, o que não se coaduna com a natureza do dissídio coletivo jurídico. Pontue-se que, mesmo se se pudesse ultrapassar a questão formal da classificação errônea do dissídio coletivo, inviável seria recebê-lo como revisional, por faltarem à ação os pressupostos processuais previstos no art. 873 da CLT: -Decorrido mais de um ano de sua vigência, caberá revisão das decisões que fixaram condições de trabalho, quando se tiverem modificado as circunstâncias que as ditaram, de modo que tais condições se hajam tornado injustas ou inaplicáveis. Processo extinto, sem resolução do mérito, por inadequação da via eleita." (Processo: DC-8013-80.2011.5.00.0000, Relator: Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 23/3/2012.)

Nesse cenário, dou provimento ao Recurso Ordinário, a fim de extinguir o feito, sem resolução de mérito, por inadequação da via eleita, nos termos do art. 267, VI, do CPC, e, por consequência, cassar a tutela antecipada renovada no acórdão recorrido. Prejudicado o exame dos demais temas do Recurso Ordinário da categoria profissional.

SINDICATO DOS CONCESSIONÁRIOS E DISTRIBUIDORES DE VEÍCULOS NO ESTADO DE SÃO PAULO – SINCODIV

Conquanto não invocada a preliminar de mérito relativa à inadequação da via eleita pelo Sindicato patronal, a decisão do capítulo anterior, no que extinguiu o processo, sem julgamento de mérito, afeta todo o feito.

Trata-se, no caso, de litisconsórcio necessário-unitário, pois, dada a comunhão de interesses de ambas as entidades sindicais (profissional e econômica), que compõem o polo passivo da demanda, na interpretação e manutenção da cláusula impugnada, não há possibilidade de haver, em tese, duas decisões conflitantes. Significa dizer: é inviável, à luz da segurança jurídica e eficácia da norma coletiva, ter como harmônica a decisão que extingue o processo com outra que eventualmente julgue o mérito, quando é mútua a relação de direitos e obrigações fixadas entre as Partes.

Nesse contexto, dou por prejudicado o exame do Recurso Ordinário do ora Recorrente.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I - conhecer do Recurso Ordinário interposto pelo Sindicato dos Comerciários de São Paulo e, no mérito, dar-lhe provimento a fim de extinguir o feito, sem resolução de mérito, por inadequação da via eleita, nos termos do art. 267, VI, do CPC; cassar a tutela antecipada renovada no acórdão recorrido; dar por prejudicado o exame dos demais capítulos; II - dar por prejudicado, igualmente, o exame do Recurso Ordinário interposto pelo Sindicato patronal. Custas invertidas.

Brasília, 9 de Setembro de 2013.

Firmado por Assinatura Eletrônica (Lei nº 11.419/2006)

Maria de Assis Calsing

Ministra Relatora

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