SALÁRIO UTILIDADE Transporte / Veículo

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Acordãos na integra

Augusto Cesar Leite de Carvalho - TST



Vale-transporte pago em dinheiro não integra o salário. VALE-TRANSPORTE. PAGAMENTO EM PECÚNIA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. A Jurisprudência pacífica desta Corte posiciona-se no sentido de que o pagamento em pecúnia do vale-transporte não altera a sua natureza indenizatória, ante o que dispõe o art. 2º da Lei 7.418/83. Nesse diapasão, ao concluir pela natureza salarial do vale-transporte, pelo simples fato de ter sido pago ao reclamante em dinheiro, o Regional contrariou a Jurisprudência deste Tribunal Superior. Recurso de revista conhecido e provido.



AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMADA EMPREZA CENTRAL DE NEGÓCIOS LTDA. APÓS À ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. VALE-TRANSPORTE. PAGAMENTO EM PECÚNIA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. Dá-se provimento ao agravo de instrumento, ante a demonstração de divergência jurisprudencial.

RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA EMPREZA CENTRAL DE NEGÓCIOS LTDA. APÓS À ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. CONTRATO UNIFICADO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA NÃO CONFIGURADA. Conforme se extrai dos autos, a reclamada extrapolou o limite legal para contratação temporária, desatendendo o prescrito nos artigos 2º e 10, § 2º da Lei 6.019/1974. Ademais, as provas confirmaram registro de contrato único. Assim, a aferição das alegações recursais requereria novo exame do quadro factual delineado na decisão regional, na medida em que se contrapõem frontalmente à assertiva fixada no acórdão regional, circunstância que atrai a incidência da Súmula 126 do TST. Recurso de Revista não conhecido.

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACIDENTE DE TRABALHO TÍPICO. PERCEPÇÃO DE AUXÍLIO DOENÇA ACIDENTÁRIO PELO INSS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. O valor arbitrado a título de reparação por dano moral somente pode ser revisado na instância extraordinária nos casos em que se vulneram os preceitos de lei ou Constituição, os quais emprestam caráter normativo ao princípio da proporcionalidade. Considerando a moldura factual definida pelo Regional e insusceptível de revisão (Súmula 126 do TST), não há parâmetros que autorizem esta Corte a analisar se o valor atribuído - R$ 20.000,00, - mostra-se excessivamente alto a ponto de se o conceber desproporcional. Não há qualquer registro acerca do tipo de acidente e respectivas sequelas, mas apenas a consignação de ser incontroversa a ocorrência do acidente, emissão da CAT, percepção de auxílio doença acidentário pelo INSS e conclusão pericial pelo nexo de causalidade. Não houve oposição de embargos declaratórios. Portanto, insuperável o óbice da Súmula 126 do TST, reitera-se, no caso concreto. Recurso de revista não conhecido.

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ASSÉDIO MORAL CONFIGURADO. O Regional, com fundamento No conjunto probatório dos autos, concluiu, com acerto, pela abusividade do poder diretivo do empregador. O TRT consignou ainda a existência de exposição do trabalhador de forma depreciativa e humilhante ante os outros trabalhadores, sendo incontestável o dano moral sofrido. Assim, deve ser reconhecida a culpa empresária. Tratando-se de dano moral, o sofrimento, decorrente de lesão à esfera íntima do sujeito, deve ser determinante para alcançar indenização, cujo sentido maior é a reparação de um dano de tal intensidade e que gere tamanha repercussão social - a qual pode ser de âmbito empresarial e até extrapolar essa esfera - a ponto de refletir de forma decisiva em sua vida, no contexto psicossocial, familiar e profissional. Recurso de revista não conhecido.

ASSÉDIO MORAL. XINGAMENTOS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. O valor arbitrado a título de reparação por dano moral somente pode ser revisado na instância extraordinária nos casos em que se vulneram os preceitos de lei ou Constituição, os quais emprestam caráter normativo ao princípio da proporcionalidade. Considerando a moldura factual definida pelo Regional e insusceptível de revisão (Súmula 126 do TST), o valor atribuído - R$ 15.000,00, - não se mostra excessivamente elevado a ponto de se o conceber desproporcional, considerando o registro do Regional acerca dos constrangimentos a que era submetido o reclamante com os constantes xingamentos sofridos. Recurso de revista não conhecido

VALE-TRANSPORTE. PAGAMENTO EM PECÚNIA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. A Jurisprudência pacífica desta Corte posiciona-se no sentido de que o pagamento em pecúnia do vale-transporte não altera a sua natureza indenizatória, ante o que dispõe o art. 2º da Lei 7.418/83. Nesse diapasão, ao concluir pela natureza salarial do vale-transporte, pelo simples fato de ter sido pago ao reclamante em dinheiro, o Regional contrariou a Jurisprudência deste Tribunal Superior. Recurso de revista conhecido e provido.

RECURSO DE REVISTA DA ECT. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. SÚMULA 331 DO TST. CULPA IN VIGILANDO. ÔNUS DA PROVA. MÁ APLICAÇÃO. A 6ª Turma do TST decidiu seguir o teor de decisões monocráticas do STF que têm afirmado que é do reclamante o ônus da prova acerca da efetiva fiscalização na execução do contrato de terceirização de mão de obra por integrante da Administração Pública. Considerando que no caso em exame a ausência de fiscalização decorreu unicamente do entendimento de não satisfação do encargo probatório pela tomadora dos serviços, o que contrariaria o entendimento exarado pela Suprema Corte - ressalvado entendimento contrário do relator -, ficou ausente registro factual específico da culpa in vigilando em que teria incorrido a tomadora de serviços. Nesse contexto, não há como manter a responsabilidade subsidiária do ente público contratante. Recurso de revista conhecido e provido. (TST-RR-2019-33.2011.5.03.0018, Augusto César Leite de Carvalho, DEJT, 17.05.19).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-2019-33.2011.5.03.0018, em que são Recorrentes e Recorridos EMPREZA CENTRAL DE NEGÓCIOS LTDA. e EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS – ECT e Recorrido PAULO HENRIQUE DE OLIVEIRA.

O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, por meio do acórdão de fls. 956-971 (numeração de fls. verificada na visualização geral do processo eletrônico – "todos os PDFs" – assim como todas as indicações subsequentes), negou provimento aos recursos ordinários das reclamadas.

A reclamada EMPREZA CENTRAL DE NEGÓCIOS LTDA. interpôs recurso de revista às fls. 975-980, com fulcro no art. 896, alíneas a e c, da CLT, alegando afronta a Lei 6.019/74 e aos arts. 453, 458, caput e § 2º, III da CLT, 5º, II e X e 7º da Constituição Federal, 186, 927 e 944 do CCB e contrariedade à Súmula 229 do TST, quanto à unidade contratual; integração dos benefícios vale refeição, transporte e cesta básica; danos morais e materiais e assédio moral.

A reclamada EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT também interpôs recurso de revista às fls. 1.006-1.021, com fulcro no art. 896, alíneas a e c, da CLT, alegando violação dos arts. 5°, inc. II, XLV, LIV, LV; 37, II e XXI e § 6º, 102, caput da Constituição Federal; 10, § 7º do Decreto-lei 200/67; 12 e 18 do Decreto Lei 509/69; 1º, V do Decreto-lei 779/69; 818 da CLT; 27, 55, XIII, 58, III, 67, 71, § 1º e 87 da Lei 8.666/93; 1º, F, da Lei 9494/97; 373, I do CPC; contrariedade à Súmula 331, II e III quanto a responsabilidade subsidiária.

O recurso da ECT foi admitido, e o apelo da primeira reclamada obstaculizado às fls. 1.022-1.026.

A primeira reclamada também interpôs agravo de instrumento às fls. 1.029-1.054.

Contrarrazões foram apresentadas às fls. 1.059-1.066 pelo reclamante contra o recurso de revista da ECT e às fls. 1.070-1.077 contra o recurso de revista da primeira reclamada.

Contraminuta foi apresentada às fls. 1.079-1.088 pelo reclamante.

Os autos não foram enviados ao Ministério Público do Trabalho, por força do artigo 95 do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

I – AGRAVO DE INSTRUMENTO DA PRIMEIRA RECLAMADA (EMPREZA CENTRAL DE NEGÓCIOS LTDA.)

1 – CONHECIMENTO

Conheço do agravo de instrumento, visto que regularmente interposto.

Convém destacar que o apelo obstaculizado rege-se pela Lei 13.015/2014, tendo em vista haver sido interposto contra decisão publicada em 12/12/2016, após o início da eficácia da aludida norma, em 22/9/2014.

2 – MÉRITO

Inicialmente, é de se frisar que o recurso de revista obstaculizado é regido pela Lei 13.015/2014; logo, o reexame de sua admissibilidade torna necessário analisar o cumprimento dos requisitos do art. 896, § 1º-A, incisos I, II e III, da CLT, inseridos pela aludida lei.

No caso em tela, o recorrente indicou o trecho do acórdão regional que consubstancia o prequestionamento da controvérsia (fls. 977-980); apresentou impugnação fundamentada mediante cotejo analítico entre a decisão recorrida e o teor da violação dos dispositivos de lei e da Constituição da República que defende (fls. 977-980), bem como quanto aos arestos transcritos para demonstrar divergência jurisprudencial (fls. 986, 989 e 994-995). Satisfeitos, portanto, os requisitos do art. 896, § 1º-A, da CLT, com a redação dada pela Lei 13.015/2014. Não obstante isso, o recurso de revista efetivamente não logra processamento, como se demonstrará a seguir.

2.1 – SALÁRIO IN NATURA: VALE-TRANSPORTE, VALE-REFEIÇÃO E CESTA BÁSICA

Ficou consignado na decisão agravada, in verbis:

"CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO / UNICIDADE CONTRATUAL.

REMUNERAÇÃO, VERBAS INDENIZATÓRIAS E BENEFÍCIOS / VALE-TRANSPORTE.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR/EMPREGADO / INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL / ACIDENTE DE TRABALHO.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR/EMPREGADO / INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL / VALOR ARBITRADO.

Examinados os fundamentos do acórdão, constato que o recurso, em seus temas e desdobramentos, não demonstra divergência jurisprudencial válida e específica, nem contrariedade com Súmula de jurisprudência uniforme do C. TST ou Súmula Vinculante do E. STF, tampouco violação literal e direta de qualquer dispositivo de lei federal e/ou da Constituição da República, como exigem as alíneas ‘a’ e ‘c’ do art. 896 da CLT.

Para a Turma Julgadora ficou demonstrado nos autos que as empresas se utilizaram do contrato temporário para satisfazer necessidade duradoura de prestação de serviços, o que impôs a unicidade contratual.

Ficou evidente para a Turma a presença do dano, da culpa e do nexo causal como pressupostos à indenização civil decorrente do acidente sofrido e, quanto ao dano material, diante das despesas realizadas.

No que se refere ao assédio moral, consagrou o Juízo a demonstração de humilhações vexatórias suficientes para garantir a indenização pleiteada.

Quanto à repercussão do vale-transporte, consagrou-se sua natureza salarial decorrente de quitação sempre em dinheiro.

O acórdão recorrido está lastreado em provas. Somente revolvendo-as seria, em tese, possível modificá-lo, o que é vedado pela Súmula 126 do C. TST.

São inespecíficos os arestos válidos colacionados, porque não abordam as mesmas premissas salientadas pela Turma julgadora, notadamente no que tange à prova dos requisitos legais para a indenização em relação ao acidente e ao assédio moral, da natureza duradoura dos contratos temporários e ao pagamento sempre em dinheiro do vale-transporte (Súmula 296 do TST).

Os arestos trazidos à colação, provenientes de Turma do C. TST, deste Tribunal ou de qualquer órgão não mencionado na alínea ‘a’ do art. 896 da CLT não se prestam ao confronto de teses.

A respeito do quantum arbitrado a título de dano moral, o TST tem se posicionado no sentido de não ser possível rever, em sede extraordinária, os valores fixados nas instâncias ordinárias a título de indenização por dano moral, exceto nos casos em que o valor seja ínfimo ou excessivamente elevado. (AgR-E-ARR - 130800-83.2009.5.09.0242, Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, SBDI-I, Data de Publicação: DEJT 12/02/2016; E-RR - 959-24.2013.5.09.0459, Relator Ministro: Cláudio Mascarenhas Brandão, SBDI-I, Data de Publicação: DEJT 11/03/2016; E-RR-39900-08.2007.5.06.0016; relator Ministro Carlos Alberto Reis de Paula, SBDI-I, DEJT 9/1/2012.)

CONCLUSÃO

DENEGO seguimento ao recurso de revista.

Alega a reclamada ofensa ao artigo 458, caput e § 2º, III da CLT.

Ficou consignado no acórdão regional:

SALÁRIO IN NATURA: VALE-TRANSPORTE, VALE-REFEIÇÃO E CESTA BÁSICA

Insurgem-se as rés contra a determinação de integração dos vales transporte, refeição e cestas básicas na remuneração obreira para fins de reflexos em outras verbas.

Ao exame.

Primeiramente, destaco que a norma do artigo 458, da CLT, elenca a alimentação como integrante do salário, in litteris:

‘Art. 458 - Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações ‘in natura’ que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas.’

É cediço que o vale alimentação fornecido com habitualidade ao empregado tem, em princípio, natureza salarial e integra a remuneração para todos os fins. Exegese que se extrai da Súmula 241, do Col. TST: ‘O vale para refeição, fornecido por força do contrato de trabalho, tem caráter salarial, integrando a remuneração do empregado, para todos os efeitos legais’.

Todavia, a alimentação fornecida via Programa de Alimentação do Trabalhador - PAT, previsto na Lei nº 6.321/76, regulamentada pelo Decreto 5/91, cujo art. 6º, reconhece, expressamente, o caráter indenizatório da utilidade, não se caracteriza parcela in natura do salário.

In casu, não havendo nos autos prova de normas coletivas atribuindo natureza indenizatória às parcelas vale-refeição e cesta básica, tampouco filiação das rés ao PAT, escorreita a r. sentença que deferiu o pleito, determinando a integração dos valores recebidos a título de vale-refeição e de cesta básica à remuneração do autor.

No que se refere aos valores percebidos a título de vale-transporte, também irreparável a r. sentença que determinou a integração das verbas na remuneração obreira para fins de reflexos nas demais verbas de natureza salarial, pelos fundamentos a seguir expostos, in verbis:

‘(...)

O preposto da 1ª ré afirma que o vale-transporte era depositado na conta do autor em espécie, o mesmo acontecendo com a cesta básica e vale-refeição, sendo que este último passou a ser pago por cartão (fls. 514).

A testemunha Heider, indicada pelo autor, afirma que o vale-refeição nunca foi pago em cartão, mas sim em depósito em conta (fls. 514).

A prova testemunhal (inclusive a confissão do preposto) atesta a percepção das parcelas em dinheiro.

Não havendo previsão em acordo ou convenção coletiva, o pagamento habitual do vale-transporte em dinheiro e não por meio de vales, tem natureza salarial.

Portanto, defiro o pedido para condenar a ré à integração dos valores recebidos a título de vale-transporte ao autor, no importe de R$165,00 mensais para gerar reflexos em férias mais 1/3, 13º, FGTS mais 40% e aviso prévio.

(...)

Quanto aos valores narrados em petição inicial (de R$165,00) mensais por parcela, não houve contestação por parte da 1ª ré. Ademais, o autor juntou aos autos extratos bancários (fls. 33/48) que comprovam os valores narrados.’

Nego provimento aos apelos" (fls. 960-961).

Analisa-se.

Em relação ao tema "vale transporte – pagamento em dinheiro – natureza indenizatória", argumentou a recorrente que a verba em comento, ainda que paga em pecúnia, não possui natureza salarial, nos termos do item III do § 2º do art. 458 da CLT. Aponta, ainda, a existência de divergência jurisprudencial.

O aresto transcrito à fl. 1.043, oriundo do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, presta-se à demonstração de divergência jurisprudencial, ante o que consta da ementa:

"INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL.

RECURSO ORDINÁRIO NTERPOSTO CONTRA DECISÃO HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO QUE CONSIDEROU SEREM DE NATUREZA INDENIZATÓRIA AS VERBAS OBJETO DA AVENÇA INCLUINDO A PARCELA DO ACORDO DISCRIMINADA COMO DIFERENÇA DE VALETRANSPORTE.

Não há falar-se em incidência de contribuições previdenciárias sobre a parcela paga a título de diferença de vale-transporte. E isso porque o transporte destinado ao deslocamento para o trabalho e retorno não tem natureza salarial, nos termos do que dispõe o artigo 458, parágrafo 2.°, inciso III, da Consolidação das Leis do Trabalho, não havendo nenhuma proibição na Lei n.° 7.418/85 de pagamento do vale-transporte em dinheiro pelo empregador, sendo ilegal a vedação constante do artigo 5.° do Decreto n.° 95.247/87, uma vez que regulamenta o que não está previsto na lei. Recurso a que se nega provimento. RECURSO ORDINÁRIO Data de Julgamento: 13/12/2007 - Relator: VANIA PARANHOS - Revisor: MARCELO FREIRE GONÇALVES - Número do Acórdão: 20071106469 - Número do Processo: 01579- 2006- 303-02-00-4 - Ano do Processo: 2007 - Turma: 12ª Data de Publicação no DOE/SP : 11/01/2008."

Assim, dou provimento ao agravo de instrumento, para determinar o processamento do recurso de revista da reclamada.

II – RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA EMPREZA CENTRAL DE NEGÓCIOS LTDA.

O recurso é tempestivo (fls. 972 e 975), subscrito por procurador regularmente constituído nos autos (fls. 334 e 975), e foi satisfeito o preparo.

2.1 – UNICIDADE CONTRATUAL – CONTRATO TEMPORÁRIO

Ficou consignado no acórdão regional:

UNICIDADE CONTRATUAL. NULIDADE DOS CONTRATOS DE TRABALHO TEMPORÁRIO. VERBAS RESCISÓRIAS

A 1ª ré sustenta a validade do contrato de trabalho temporário celebrado com o autor, pleiteando a exclusão da condenação quanto ao pagamento das verbas decorrentes da invalidade desta modalidade contratual.

Por sua vez, a 2ª ré (ECT) sustenta a constitucionalidade do artigo 71 da Lei nº 8.666/1993, conforme v. decisão do Col. Supremo Tribunal Federal, proferida na ADC nº 16.

Sem razão, contudo.

In casu, foi juntada aos autos cópia da CTPS (fls. 23/25), em que a 1ª ré registrou contrato de trabalho único na CTPS do autor, à fl. 25, de 29/11/10 a 04/08/11, de modo que restou comprovada, de pronto, a inobservância ao requisito do lapso temporal de validade do contrato temporário, exigido pelo artigo 10, da Lei nº 6.019/1974. Repiso, pois houve a extrapolação do prazo de 3 meses previsto na retro mencionada norma.

Também foi apresentado nos autos apenas o primeiro contrato de trabalho temporário firmado entre o autor e a 1ª ré, no período de 29.11.2010 a 22.02.2011 (fls. 118/120), não constando nos autos o alegado segundo contrato de trabalho firmado, conforme aduzido pela 1ª demandada, realizado no período de 01.03.2011 a 05.08.2011.

Ainda, foi juntado aos autos o contrato firmado entre as rés (fls. 93/107), do qual constou expressamente o motivo justificador do trabalho temporário, nos termos do artigo 9º, Lei nº 6.019/1974, qual seja, suprir a carência transitória de pessoal regular e permanente ou o acréscimo extraordinário de serviços (item 1.1, f. 93).

Contudo, conforme se infere do item 6 do contrato de trabalho firmado entre o autor e a 1ª ré, ‘a vigência deste contrato inicia-se na data de sua assinatura e termina quando cessado o motivo justificador da demanda não podendo ultrapassar o prazo de 90 dias (...)’ (fl. 118).

Nesse passo, como bem pontuou o d. juízo de origem, a prova produzida nos autos indica a nítida intenção das rés em utilizar contratos temporários para satisfazer uma real necessidade duradoura de prestação de serviços. Veja-se (fls. 565/567):

‘UNICIDADE CONTRATUAL

O autor requer a declaração de unicidade contratual dos contratos firmados com a 1ª ré uma vez que não caracterizados os requisitos justificadores do suposto contrato temporário firmado.

A 1ª ré alega que o autor foi contratado por meio de contrato de trabalho temporário, em dois períodos distintos, sendo o primeiro de 29/11/10 a 22/02/11 e o segundo de 01/03/11 a 05/08/11, por necessidade extraordinária de serviços, tendo sido feito o pagamento das verbas rescisórias nas duas oportunidades.

Pois bem.

A contratação de trabalho temporário, na hipótese, é inválida para os fins colimados.

A lei n° 6019/74 tem requisitos escritos que devem ser rigorosamente obedecidos, tratando-se de uma exceção à regra geral de contrato por prazo indeterminado. E, na hipótese em questão, tais requisitos não foram observados.

A uma, porquanto a 1ª ré registrou contrato de trabalho único na CTPS do autor, às fls. 25, de 29/11/10 a 04/08/11.

A duas, porquanto a 1ª ré somente juntou aos autos documento referente ao primeiro contrato de trabalho temporário firmado com o reclamante, em 29/11/10. Não há nos autos comprovação do segundo contrato de trabalho firmado ou da existência de dois contratos de trabalho distintos, conforme alega.

Desta forma, configura-se mera locação de mão de obra, sem configuração dos requisitos estritos necessários para o real trabalho temporário. Os requisitos meramente formais são insuficientes e, na hipótese, conforme já se demonstrou acima, a 1ª ré sequer juntou aos autos cópia dos dois contratos de trabalho firmados. Ademais, anotou na CTPS do reclamante a existência de contrato de trabalho único, abrangendo os dois períodos, conforme narrado na petição inicial.

Neste contexto, não satisfeitos os requisitos do artigo 2° da Lei 6019/74, tendo a contratação temporária sido utilizada como mero artificio, impõe-se reconhecer a contratação por prazo indeterminado, em unicidade com o pacto imediatamente celebrado entre o autor e a tomadora, sem solução de continuidade na prestação de serviços e sem alteração das circunstâncias laborais.

Pelo exposto, declara-se a unicidade contratual do contrato de trabalho celebrado entre o autor e a primeira ré de 29/11/10 a 04/08/11 e declara-se a nulidade dos termos de rescisão efetuados, por não espelharem a realidade do contrato laboral único.

A contratação do autor, na forma como efetivada, não atende aos requisitos da Lei 6.019/74, e indica que havia necessidade de pessoal permanente e não de forma extraordinária, a justificar a admissão do reclamante nos moldes encetados.’ - Original sem destaques.

Deste modo, nada há nada que se reparar no julgado de origem que declarou a invalidade do contrato temporário celebrado entre as partes, deferindo ao autor todas as verbas decorrentes da rescisão de contrato por prazo indeterminado.

Pelo exposto, nego provimento" (fls. 958-960).

A reclamada interpôs recurso de revista às fls. 975-1.001, ao qual se negou seguimento às fls. 1.022-1.024, sob o fundamento de que o acórdão recorrido está lastreado em provas (Súmula 126 do TST) e por não especificidade dos arestos (Súmula 296 do TST).

À análise.

Conforme se extrai dos autos, a reclamada extrapolou o limite legal para contratação temporária, desatendendo o prescrito nos artigos 2º e 10, § 2º da Lei 6.019/1974. Ademais, as provas confirmaram registro de contrato único.

Assim, a aferição das alegações recursais requereria novo exame do quadro factual delineado na decisão regional, na medida em que se contrapõem frontalmente à assertiva fixada no acórdão regional, circunstância que atrai a incidência da Súmula 126 do TST.

Não conheço.

2.2 – ACIDENTE DO TRABALHO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. ESTABILIDADE ACIDENTÁRIA

Ficou consignado no acórdão regional:

ACIDENTE DO TRABALHO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. ESTABILIDADE ACIDENTÁRIA

Informo, inicialmente, que o autor foi admitido em 29/11/2000, para o exercício da função de Operador de Triagem e Transbordo, sendo o contrato de trabalho extinto em 04/08/2011. A remuneração utilizada para fins rescisórios foi de R$ 807,29, conforme TRCT de fl. 27.

O d. Julgador, reconheceu a responsabilidade civil da 1ª ré pelo acidente do trabalho sofrido pelo autor, condenando-a ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$20.000,00.

As rés pretendem a reforma da r. sentença, argumentando, em síntese, que não restaram preenchidos os pressupostos legais para a responsabilização civil das recorrentes. Pedem, sucessivamente, a redução do valor da indenização.

Analiso.

A responsabilidade civil tem previsão nos artigos 5º, inciso X, e 7º, inciso XXVIII, da CF/88, bem como nos artigos 186 e 927, do Código Civil, sendo necessária para configuração do dano moral e, consequentemente, do dever de indenizar, que se constatem, ao mesmo tempo, três pressupostos essenciais, quais sejam: ocorrência do dano, ação/omissão dolosa ou culposa do agente e nexo causal entre esta ação/omissão e o prejuízo.

A prova da existência desses três pressupostos é ônus da parte que almeja a indenização.

No presente caso, é fato incontroverso nos autos o acidente do trabalho ocorrido nas dependências da 1ª ré (vide CAT à f. 52).

Pontue-se que o quadro clínico do autor, de natureza acidentária na seara trabalhista, também foi reconhecido pela Autarquia Previdenciária - INSS que concedeu ao demandante auxílio-doença, na espécie acidentária, sob o código 091, conforme demonstrado pelo documento de fl. 53.

Ademais, a prova pericial, quanto ao nexo de causalidade, demonstrou que (f. 384):

‘A simples leitura da CAT já indica o dia, a hora, o local e os detalhes da ocorrência. A descrição mencionada facilita a percepção do vínculo de causalidade do infortúnio com a execução do contrato laboral.

Portanto, não resta dúvida de que houve culpa da 1ª ré no presente caso, haja vista, como detalhadamente exposto pelo d. Sentenciante (fls. 571/572), que é obrigação do empregador propiciar ambiente seguro de trabalho a seus empregados, tomando as medidas de segurança necessárias que impeçam a ocorrência de acidentes do trabalho, preservando a higidez física e emocional de seus empregados, bem assim oferecendo os equipamentos de segurança aptos a evitar qualquer tipo de acidente.

Portanto, diante desse cenário, não vejo razão no inconformismo das empresas, pois demonstrada a presença do dano, da culpa e do nexo causal, a reparação civil dos prejuízos suportados pelo autor é medida que se impõe.

O mesmo ocorre com a reparação material deferida, uma vez comprovado nos autos que o autor, em decorrência do acidente sofrido, teve que pagar consultas médicas no importe de R$150,00 (f. 54).

Quanto ao valor da indenização por danos morais, o montante fixado pelo Juízo a quo (R$20.000,00) se mostra razoável e proporcional aos prejuízos suportados pelo autor, cumprido, portanto, sua finalidade compensatória. O valor em apreço não se mostra exagerado, de modo a causar enriquecimento ilícito da vítima, e está dentro da capacidade econômica dos ofensores. Além disso, a indenização imposta cumpre, também, sua finalidade pedagógica, de modo a coibir a reincidência, pelas rés, na prática de atos ilícitos dessa mesma natureza.

No que tange à indenização substitutiva ao período estabilitário, apurado nos autos os requisitos para a obtenção da estabilidade provisória, quais sejam: (i) que o autor sofreu acidente de trabalho; (ii) recebeu auxílio-doença acidentário (B 91); e (iii) permaneceu por mais de 15 dias afastado pelo INSS de suas atividades laborais, o direito à garantia provisória de emprego acidentária por 12 meses, após a cessação do auxílio acidentário recebido é medida que se impõe, nos exatos termos do art. 118, da Lei nº 8.213/91.

Portanto, não há, no aspecto, nada a reparar.

Ante o exposto, nego provimento aos apelos" (fls. 961-963).

A reclamada alega violação dos artigos 186, 927 e 944 do CCB, 5º, II e X e 7º, XXVIII da Constituição Federal e contrariedade à Súmula 229 do TST.

Sustenta que não houve dolo ou culpa sua pelo acidente ocorrido, sendo do recorrido toda a culpa uma vez que transitava em local inapropriado. Argumenta ainda que a indenização não observou os princípios da razoabilidade.

Analisa-se

O registro do Regional é de estar incontroverso nos autos que o acidente de trabalho típico ocorreu nas dependências da reclamada, percepção com auxílio doença do INSS com base em acidente de trabalho, código 091, com demonstração de dano, culpa e nexo causal (fl. 962).

Cumpre destacar que o valor arbitrado a título de reparação por dano moral somente pode ser revisado na instância extraordinária nos casos em que vulnera os preceitos de lei ou Constituição, que emprestam caráter normativo ao princípio da proporcionalidade. Considerando a moldura factual definida pelo Regional, e insusceptível de revisão (Súmula 126 do TST).

Não há parâmetros que autorizem esta Corte a analisar se o valor atribuído - R$ 20.000,00, - mostra-se excessivamente alto a ponto de se o conceber desproporcional. Não há qualquer registro acerca do tipo de acidente e respectivas sequelas, mas apenas a consignação de ser incontroversa a ocorrência do acidente, emissão da CAT, percepção de auxílio doença acidentário pelo INSS e conclusão pericial pelo nexo de causalidade. Não houve oposição de embargos declaratórios. Portanto, insuperável o óbice da Súmula 126 do TST, reitera-se, no caso concreto.

 A Súmula 229 do TST trata de sobreaviso, tema estranho nestes autos.

Não conheço.

2.3 – DANOS MORAIS POR ASSÉDIO MORAL

Ficou consignado no acórdão regional:

"DANOS MORAIS POR ASSÉDIO MORAL

Conforme narra a petição inicial, o autor durante seu contrato de trabalho, passou por situações de constrangimento, humilhação e vergonha, sendo chamado de ‘burro’ e ‘analfabeto’, entre outros insultos provenientes de outros empregados. Pede a reparação por danos morais supostamente sofridos.

A r. sentença acolheu o pedido, pelos seguintes fundamentos (fls. 573):

‘INDENIZAÇAO POR DANOS MORAIS

Examinando o conjunto probatório, à luz dos artigos 131 e 335/CPC tem-se que, de fato, houve dano moral à imagem do autor, no ambiente de trabalho e a ré omitiu-se de tomar uma atitude a respeito.

Com efeito, o empregador deve manter no ambiente de trabalho o respeito a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, bem como promover o bem de todos sem quaisquer formas de discriminação, conforme princípios fundamentais expressos na Constituição da República (artigos 1°, III e IV, 3°, I e IV).

A testemunha Heider, indicada pelo autor, afirma que alguns funcionários do 2º réu faziam piadinhas que a 1ª ré deveria ter contratado homens, mas contrataram mulherzinhas, sendo que Eurico, funcionário da 2ª ré, mostrou as câmeras e disse que não poderiam furtar nada; que Eurico os chamou duas vezes de burro, sendo que sempre haviam insinuações quanto ao serviço chamando o pessoal de burro, inclusive o autor e os demais; (...) que Eurico agia da forma acima em qualquer lugar, inclusive com todos os funcionários juntos; que os insultos de Eurico eram direcionados a todo o pessoal da 1ª ré, inclusive o autor. (fls. 514).

Restou comprovada a exposição do obreiro, de forma depreciativa e humilhante, perante os outros funcionários. O autor foi submetido a tratamento degradante constante de humilhações e constrangimentos aptos a abalar sua honra objetiva. O dano moral sofrido pela vítima é incontestável.

Examinado o contexto respectivo fixa-se a indenização por danos morais, pela humilhação sofrida, em R$ 15.000,00, à luz dos artigos 131/CPC, 335/CPC, 5º X da CR/88, 186 CC, 927 e seu § único CC, 944CC, e 950 CC.’ - Original sem destaques

Ao exame.

Marie France Hirigoyen conceitua o assédio moral como ‘toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se, sobretudo, por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, por em perigo seu emprego ou degradar o seu ambiente de trabalho’ (A violência do cotidiano. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001, p. 65).

O assédio moral constitui uma das espécies de dano moral. Consiste em conduta que expõe o trabalhador a uma série de situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no desempenho de suas funções, comumente provenientes de relações hierárquicas autoritárias, em que se configuram condutas antiéticas perpetuadas no tempo, de um ou mais superiores hierárquicos e direcionadas a um ou mais subordinados.

Os atos perpetrados e repetidos ao longo do tempo, desestabilizam emocionalmente o empregado em relação ao ambiente de trabalho e à organização empresarial como um todo, podendo vir a se tornar insuportável, sendo inequívoco que, havendo dano decorrente de ação ilícita, ele deve ser reparado, nos termos dos art. 186 e 927, do Código Civil e artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal.

Em relação à prática do assédio moral, este pode se verificar em diversas formas. Revela-se vertical quando é praticado por sujeitos de diferentes graus hierárquicos. Logo, pode ser vertical descendente (ato ilícito praticado pelo empregado hierarquicamente superior) ou vertical ascendente (empregado hierarquicamente inferior age com o intuito de assediar o superior hierárquico). Por sua vez, o assédio moral horizontal ocorre entre empregados do mesmo grau hierárquico.

As decisões dos tribunais trabalhistas têm seguido o entendimento de que a inércia injustificável do empregador em determinar que o assediador cesse de imediato as agressões faz surgir a obrigação de indenizar o assediado, que, muitas vezes, não tem meios próprios para conter o assédio.

Sobre o assédio moral, colaciono decisão deste Regional, in verbis:

‘EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ASSÉDIO MORAL. ELEMENTOS CARACTERIZADORES. Os três elementos caracterizadores do assédio moral são: a intensidade da violência psicológica; o prolongamento no tempo e a finalidade de ocasionar um dano psíquico ou moral ao empregado. Além disso, sabe-se que o dano moral passível de recomposição é aquele causado pela subversão ilícita de valores subjetivos inerentes à pessoa humana. A Constituição Brasileira de 1988 albergou, como princípio fundamental, a valoração da dignidade da pessoa humana (foco ou centro para o qual deve convergir toda nossa atenção). É certo, no entanto, que esses valores se mostram acolchoados por um manto de subjetividade e/ou abstração valorativa, decorrentes da própria natureza do bem protegido. Contudo, essa sensação de dor interior pode ser percebida e aferida in re ipsa, notadamente se nos abstrairmos do materialismo do mundo moderno, realizando uma inflexão moral na centralidade do homem (ser humano) como razão existencial. Nesta toada, atos ilícitos, que nos tenham ou nos assemelhem à verdadeiros objetos (coisa), renegando a nossa essência humana, são, em tese, passíveis de recomposição. E essa reparação, embora não devesse ter essa característica, dada a impossibilidade de se restabelecer as pessoas envolvidas ao status quo ante, o que seria o ideal para esse tipo de ofensa, se torna o único caminho a ser trilhado. Assim, a ‘indenização’ por dano moral, decorrente do contrato de trabalho, pressupõe a prática de ato ilícito ou o erro de conduta do empregador ou de preposto seu, o nexo de causalidade entre a conduta anti jurídica e o dano experimentado, cumprindo ao Julgador examinar a presença concomitante desses pressupostos fático-jurídicos para, a partir da demonstração inequívoca. especialmente do primeiro e último desses elementos mencionados, porquanto, relativamente ao dano, esse se caracteriza in re ipsa (através do próprio evento, ou seja, da ofensa perpetrada à dignidade da pessoa humana) determinar a recomposição dos danos decorrentes à subversão dos valores subjetivos do empregado, causados pelo seu empregador.’ (TRT3. 0000398-30.2015.5.03.0157. Primeira Turma. Rel. Des. Luiz Otávio Linhares Renault. Data de publicação: 27/04/2016)

Destaco que a responsabilidade do empregador pelos atos de seus empregados no ambiente de trabalho está relacionada com a sua obrigação de dirigir, fiscalizar e punir os empregados cujas condutas sejam deletérias e danosas uns contra os outros, sendo uma das obrigações primordiais dos empregadores zelar por ambiente de trabalho saudável.

No presente caso, os fatos devidamente comprovados pelo depoimento da única testemunha ouvida nos autos, Sr. Heider Vieira, à f. 515, se revelam por demais graves. A partir da prova oral produzida, conclui-se que, de fato, houve efetiva ofensa à honra do autor. Inadmissível que a ascendência hierárquica autorize os colegas de trabalho a transgredirem normas básicas de respeito e urbanidade, com ofensa à dignidade do trabalhador, não se tratando, a meu sentir, de mero incômodo proveniente de situações corriqueiras - como nos querem fazer crer as rés - mas, verdadeiramente, de humilhações vexatórias.

Comprovado, pois, que o autor, no ambiente laboral, estava submetido a constrangimento que, em razão da circunstância, causava-lhe sofrimento moral, faz jus à indenização pleiteada.

Assim, configurado dano de ordem moral, demonstrado o ilícito e patente o nexo de causalidade, estão presentes os requisitos ensejadores da responsabilização civil empresária, ex vi do disposto nos artigos 186 e 927, do CCB e inciso X, do artigo 5º, da Lei Maior.

Por outro lado, a dignidade da pessoa não é passível de valoração pecuniária, constituindo numa das tarefas mais árduas o arbitramento da reparação de danos morais. Não sendo possível, desse modo, a aferição exata e objetiva dos danos morais, o quantum deve ser fixado por arbitramento, levando-se em conta as circunstâncias do caso. A indenização deve ser moderada e proporcional, observado o grau de culpa da empregadora, a extensão do dano e o porte econômico das partes, tudo com observância ao princípio da razoabilidade, de forma a não cair nos extremos de fixação de valores irrisórios ou excessivos, que resultem em enriquecimento ilícito da vítima ou no empobrecimento da empregadora, devendo o valor a ser arbitrado se constituir em meio pedagógico para desestimular o agente de repetir a prática do ato ilícito.

A par disso, entendo que o valor de R$15.000,00 (quinze mil reais) arbitrado na Origem se mostra razoável e adequado à particular situação dos autos.

Nego provimento aos apelos, mantendo a condenação em primeiro grau, nos seus exatos termos" (fls. 963-966).

A reclamada alega violação dos artigos 186, 927 e 944, parágrafo único do CCB, 5º, X da Constituição.

Sustenta não ser de seu conhecimento quaisquer ocorrências de constrangimento ou ofensa sofrido pelo reclamante, não havendo qualquer tipo de assédio e que jamais foi imposto ao recorrido a realização de tarefas impossíveis ou em quantidade excessiva. Argumenta ainda que a indenização não observou os princípios da razoabilidade.

Analisa-se

O valor arbitrado a título de reparação por dano moral somente pode ser revisado na instância extraordinária nos casos em que se vulneram os preceitos de lei ou Constituição, os quais emprestam caráter normativo ao princípio da proporcionalidade. Considerando a moldura factual definida pelo Regional e insusceptível de revisão (Súmula 126 do TST), o valor atribuído - R$ 15.000,00, - não se mostra excessivamente elevado a ponto de se o conceber desproporcional, considerando o registro do Regional acerca dos constrangimentos a que era submetido o reclamante com os constantes xingamentos sofridos.

Não conheço.

2.4 - VALE-TRANSPORTE. PAGAMENTO EM PECÚNIA. NATUREZA INDENIZATÓRIA

Conhecimento

Conforme já analisado no agravo de instrumento, ficou demonstrada divergência jurisprudencial apta a promover o conhecimento do apelo.

Conheço do recurso de revista por divergência jurisprudencial.

Mérito

A Jurisprudência pacífica desta Corte posiciona-se no sentido de que o pagamento em pecúnia do vale-transporte não altera a sua natureza indenizatória, ante o que dispõe o art. 2º da Lei 7.418/83.

Nesse sentido:

"(...) VALE-TRANSPORTE. PAGAMENTO EM PECÚNIA. NATUREZA JURÍDICA. A vedação dada pelo Decreto 95.247/87, quanto ao pagamento do vale-transporte em pecúnia, não tem o condão de conferir natureza salarial à parcela, por expressa previsão legal em sentido contrário. Decisão regional em conformidade com a jurisprudência pacífica da Corte. Recurso de revista não conhecido. (...)" (TST-RR-1812-55.2012.5.03.0032, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, DEJT de 15/5/2015.)

"(...). VALE-TRANSPORTE. PAGAMENTO EM PECÚNIA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. O artigo 2º, ‘a’, da Lei nº 7.418/85, prevê que o vale-transporte não tem natureza salarial, nem se incorpora à remuneração para quaisquer efeitos. Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte Superior tem se manifestado que a concessão em pecúnia não tem o condão de alterar a natureza jurídica da parcela, que, por disposição expressa da lei, é indenizatória. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento." (TST-RR-319-35.2011.5.01.0064, Rel. Min. Cláudio Mascarenhas Brandão, 7ª Turma, DEJT de 31/3/2015.)

"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RECURSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. 1. VALE-TRANSPORTE PAGO EM PECÚNIA. INTEGRAÇÃO AO SALÁRIO. A mera concessão do benefício em dinheiro não tem o condão de transmudar a natureza jurídica do vale-transporte, que, por disposição legal, é indenizatória e não constitui base de incidência para a contribuição previdenciária e para o FGTS. Precedentes. (...)" (TST-AIRR-10308-39.2013.5.03.0032, Rel. Min. Dora Maria da Costa, 8ª Turma, DEJT de 20/3/2015.)

"(...). 2. VALE-TRANPOSTE. PAGAMENTO EM PECÚNIA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. NÃO CONHECIMENTO. Nos termos do artigo 2º, ‘a’, da Lei nº 7.418/85, o vale-transporte não tem natureza salarial nem se incorpora à remuneração para quaisquer efeitos. Ademais, o artigo 458, § 2º, III, da CLT igualmente não considera como salário o 'transporte destinado ao deslocamento para o trabalho e retorno, em percurso servido ou não por transporte público.' A percepção do benefício em pecúnia não transmuda natureza indenizatória do vale-transporte. Recurso de revista de que não se conhece. (...)" (TST-RR-104000-37.2008.5.01.0028, Rel, Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos, 5ª Turma, DEJT de 30/5/2014.)

"RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA. VALE-TRANSPORTE PAGO EM PECÚNIA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. Tanto o art. 2.º, alíneas 'a' e 'b', da Lei n.º 7.418/85 quanto o art. 28, § 9.º, 'f', da Lei n.º 8.212/91 estabelecem a natureza indenizatória dos valores pagos a título de vale-transporte. Assim, o pagamento da parcela em dinheiro não possui a faculdade de mudar seu caráter indenizatório, porquanto não revela, por si só, alteração de sua finalidade. (...)" (TST-RR-238-06.2012.5.03.0029, Rel. Min. Maria de Assis Calsing, 4ª Turma, DEJT de 16/5/2014.)

Nesse diapasão, ao concluir pela natureza salarial do vale-transporte, pelo simples fato de ter sido pago ao reclamante em dinheiro, o Regional contrariou a Jurisprudência deste Tribunal Superior.

Dou provimento ao recurso de revista para declarar a natureza indenizatória do vale-transporte pago em dinheiro ao reclamante e, consequentemente, expungir da condenação às parcelas decorrentes de sua integração à remuneração.

II – RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA ECT

O recurso é tempestivo (fls. 972 e 1.006), subscrito por procurador regularmente constituído nos autos (fls. 74 e 1.007), e é dispensado o preparo.

1 – RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA – ÔNUS DA PROVA

Ficou consignado no acórdão regional:

"RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA SEGUNDA RÉ (ECT). RESPONSABILIDADE DE TERCEIRO GRAU

A 2ª ré não se conforma com sua responsabilização subsidiária, argumentando, em síntese, ser incabível a aplicação de responsabilidade ao ente público, por força do art. 71 da Lei nº 8.666/93 e da Súmula 331, V, do TST, não havendo o autor comprovado a falta ou falha de fiscalização do órgão público contratante.

Examino.

O caso sob análise é típico de terceirização de serviços realizada por pessoa jurídica integrante da Administração Pública, por meio de contrato administrativo firmado com empresa interposta, com amparo na Lei de Licitações.

Como já consignado pelo Juízo de Origem, é incontroversa a prestação de serviços do autor em favor da 2ª ré, ECT (f. 524):

‘O preposto da 1ª ré afirma que o autor trabalhou nas dependências da 2ª ré (fls. 514).

A real empregadora da reclamante foi a primeira reclamada, porém, a segunda ré responde, subsidiariamente, por todas as obrigações trabalhistas descumpridas pela prestadora de serviços vez que se beneficiou dos serviços da autora devendo responder subsidiariamente, frise-se, pelo inadimplemento da primeira reclamada, exceto quanto às obrigações exclusivas de fazer, mas responde pelas indenizações respectivas (Artigo 9º/CLT, Súmula 331, IV/TST).’

No que concerne à responsabilidade subsidiária da ECT, integrante da Administração Pública, cumpre frisar que o artigo 71, §1º, da Lei de Licitações, deve ser interpretado de forma compatível com o conjunto do ordenamento jurídico e com os demais dispositivos constantes da própria Lei, o que não resulta em violação ao art. 97 da CF/88, ou à Súmula Vinculante 10 do STF, tampouco ao art. 22, I e XLVII e XLVIII da CF/88 ou ao princípio da Separação dos Poderes.

A jurisprudência atualmente encontra-se consolidada sobre a matéria, nos termos da Súmula 331 do TST, cuja constitucionalidade não se discute, visto que restou reconhecida a possibilidade de responsabilização da Administração Pública na hipótese de omissão do ente público quanto à fiscalização das obrigações trabalhistas por parte da empresa contratada, conforme se infere dos itens IV, V e VI do aludido preceito sumulado (Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31/05/2011), assim dispõe:

‘IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

VI - A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.’

Para aferir se dado ente público agiu com diligência na fiscalização do contrato de terceirização entabulado com empresa privada, cabe dele exigir produção de prova robusta e inequívoca nesse sentido, pois as normas de regência são claras a esse respeito. Veja-se que o item V acima transcrito alude à Lei de Licitações, que traz em seu bojo as seguintes diretrizes:

‘Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de:

(...)

III - fiscalizar-lhes a execução;

IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste’

Impõe-se ao ente público, dessarte, o dever legal de fiscalizar a execução do contrato firmado com a prestadora de serviços, inclusive, por óbvio, no que concerne ao cumprimento das obrigações fiscais e trabalhistas, podendo, neste mister, aplicar sanções por eventual descumprimento parcial ou total da avença.

Buscando instrumentalizar a fiscalização de modo eficiente e profícuo, a mesma norma preconiza:

Art. 67. A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição.

§ 1º O representante da Administração anotará em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com a execução do contrato, determinando o que for necessário à regularização das faltas ou defeitos observados.

Normatizando a questão em âmbito administrativo, a Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão editou a Instrução Normativa MP nº 2, de 30 de abril 2008, com o escopo de disciplinar a contratação de serviços por órgãos ou entidades integrantes do Sistema de Serviços Gerais (SISG).

Aludida norma é minuciosa quanto à atividade de vigilância em torno da execução dos contratos. Importante ressaltar que, ainda na fase pré-contratual, exige-se cuidado na elaboração do instrumento convocatório, conforme os seguintes dispositivos:

Art. 19. Os instrumentos convocatórios devem conter o disposto no art. 40 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, indicando ainda, quando couber:

(...)

XVIII - disposição prevendo que a execução completa do contrato só acontecerá quando o contratado comprovar o pagamento de todas as obrigações trabalhistas referentes à mão de obra utilizada, quando da contratação de serviço continuado com dedicação exclusiva de mão de obra; e (Incluído pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009).

XIX - exigência de garantia, com validade de 3 (três) meses após o término da vigência contratual, devendo ser renovada a cada prorrogação efetivada no contrato, nos moldes do art. 56 da Lei nº 8.666, de 1993, para os serviços continuados com uso intensivo de mão de obra com dedicação exclusiva, com a previsão expressa de que a garantia somente será liberada ante a comprovação de que a empresa pagou todas as verbas rescisórias trabalhistas decorrentes da contratação, e que caso esse pagamento não ocorra até o fim do segundo mês após o encerramento da vigência contratual, a garantia será utilizada para o pagamento dessas verbas trabalhistas diretamente pela Administração, conforme estabelecido no art. 19-A, inciso IV desta Instrução Normativa.

Como se nota, o cuidado da Administração Pública para com os contratos de terceirização de serviços deve ser observado antes mesmo de sua formação, ainda na fase de elaboração do edital de licitação, que deve conter cláusulas de garantia contratual buscando assegurar o adimplemento dos encargos trabalhistas.

Esse zelo se estende, como não poderia deixar de ser, à própria execução contratual, que deve ser rigorosamente acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração, conforme detalhado nos seguintes dispositivos da mesma Instrução Normativa, in verbis:

‘Art. 31. O acompanhamento e a fiscalização da execução do contrato consistem na verificação da conformidade da prestação dos serviços e da alocação dos recursos necessários, de forma a assegurar o perfeito cumprimento do contrato, devendo ser exercidos por um representante da Administração, especialmente designado na forma dos arts. 67 e 73 da Lei nº 8.666/93 e do art. 6º parágrafo único. Além das disposições previstas neste capítulo, a fiscalização contratual dos serviços continuados deverá seguir o disposto no anexo IV desta IN.

(...)

Art. 34. (...)

§ 5º Na fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas e sociais nas contratações continuadas com dedicação exclusiva dos trabalhadores da contratada, exigir-se-á, dentre outras, as seguintes comprovações:

I - no caso de empresas regidas pela Consolidação das Leis Trabalhistas:

a) a prova de regularidade para com a Seguridade Social, conforme dispõe o art. 195, § 3º, sob pena de rescisão contratual;

b) recolhimento do FGTS, referente ao mês anterior, caso a Administração não esteja realizando os depósitos diretamente, conforme estabelecido no instrumento convocatório;

c) pagamento de salários no prazo previsto em Lei, referente ao mês anterior;

d) fornecimento de vale transporte e auxílio alimentação quando cabível;

e) pagamento do 13º salário;

f) concessão de férias e correspondente pagamento do adicional de férias, na forma da Lei;

g) realização de exames admissionais e demissionais e periódicos, quando for o caso;

h) eventuais cursos de treinamento e reciclagem que forem exigidos por lei;

i) comprovação do encaminhamento ao Ministério do Trabalho e Emprego das informações trabalhistas exigidas pela legislação, tais como: a RAIS e a CAGED;

j) cumprimento das obrigações contidas em convenção coletiva, acordo coletivo ou sentença normativa em dissídio coletivo de trabalho; e

k) cumprimento das demais obrigações dispostas na CLT em relação aos empregados vinculados ao contrato.’

Em caso de inobservância dessas regras, a Administração Pública incide em culpa in vigilando, atraindo a responsabilidade subsidiária.

Assim, repita-se, apenas a Administração Pública detém aptidão para provar que fiscalizou efetivamente a empresa contratada. E deve fazê-lo, como é óbvio, documentando detalhadamente a relação jurídica em todos os seus contornos. Sem a prova constituída previamente quanto a essa fiscalização, não poderá o Judiciário avaliar se a postura do ente público foi diligente ou negligente, presumindo-se sempre esta em detrimento daquela.

Nessa linha de raciocínio, não se pode exigir do empregado que comprove a negligência do ente público tomador dos serviços, pois significaria exigir prova de fato negativo, tornando praticamente impossível a sua comprovação por parte do empregado.

Compulsando os autos, verifico que a 2ª ré não colacionou qualquer prova acerca da efetiva fiscalização da observância dos direitos dos empregados da empresa contratada, ou de qualquer providência adotada em decorrência do descumprimento da legislação trabalhista pela 1ª ré.

Diante disso, havendo o reconhecimento de débito trabalhistas da empresa prestadora de serviços para com o empregado, é imperioso que a 2ª ré seja responsabilizada subsidiariamente por sua quitação.

Destaque-se que o agir culposo da Administração Pública atrai a responsabilização ampla sobre todas as verbas oriundas do contrato de emprego, nos termos do item VI da Súmula 331 do C. TST, alhures transcrito, inexistindo violação à Súmula 374 do TST.

Esclareça-se, por fim, que o devedor subsidiário responde pela dívida trabalhista depois de esgotados os meios de execução contra o devedor principal. Não cabe falar em responsabilização em terceiro grau (desconsideração da personalidade jurídica da primeira ré com o direcionamento da execução contra seus sócios), medida que acabaria por transferir para o empregado hipossuficiente o encargo de uma busca incerta e morosa de bens daquelas pessoas físicas passíveis de execução.

Nesse sentido, a OJ 18 deste Egrégio Regional:

EXECUÇÃO. DEVEDOR SUBSIDIÁRIO. RESPONSABILIDADE EM TERCEIRO GRAU. INEXISTÊNCIA. É inexigível a execução prévia dos sócios do devedor principal inadimplente para o direcionamento da execução contra o responsável subsidiário.

Assim, deve-se considerar o processo como um meio eficaz de prestação jurisdicional, primando-se pela garantia fundamental à duração razoável - art. 5º, inciso LXXVIII, da CF/88 - e à ordem jurídica justa (sob a ótica do direito fundamental à ordem jurídica justa), inexistindo, portanto, violação ao art. 5º, II, da CF/88.

Por derradeiro, ressalte-se que o responsável subsidiário somente pode se valer do benefício de ordem caso nomeie bens da devedora principal, livres, desembaraçados e suficientes para o pagamento do crédito exequendo, como estabelecido no § 2º, do artigo 795, do NCPC.

Nego provimento" (fls. 966-970).

A ECT interpôs recurso de revista às fls.1.006-1.021, com fulcro no art. 896, alíneas a e c, da CLT, alegando violação dos arts. 5°, inc. II, XLV, LIV, LV; 37, II e XXI e § 6º, 102, caput da Constituição Federal; 10, § 7º do Decreto-lei 200/67; 12 e 18 do Decreto Lei 509/69; 1º, V do Decreto-lei 779/69; 818 da CLT; 27, 55, XIII, 58, III, 67, 71, § 1º e 87 da Lei 8.666/93; 1º, F, da Lei 9494/97; 373, I do CPC; contrariedade à Súmula 331, II e III, quanto a responsabilidade subsidiária. Alega que adotou todas as medidas que lhe cabiam, a fim de fiscalizar o contrato, tudo nos termos do art. 87 da Lei 8.666/93 e que competia ao recorrido comprovar o sue ato culposo. O recurso de revista foi recebido por possível contrariedade à Súmula 331, V do TST.

Transcreve arestos para o confronto de teses.

À análise.

Inicialmente, é de se frisar que o recurso de revista obstaculizado é regido pela Lei 13.015/2014; logo, o reexame de sua admissibilidade torna necessário analisar o cumprimento dos requisitos do art. 896, § 1º-A, incisos I, II e III, da CLT, inseridos pela aludida lei.

O recorrente logrou demonstrar a satisfação dos novos requisitos estabelecidos no referido dispositivo.

Ultrapassado esse exame inicial, é necessário perquirir acerca da satisfação dos requisitos estabelecidos nas alíneas do artigo 896 da CLT.

Ao reconhecer a constitucionalidade do artigo 71 da Lei 8.666/1993 (ADC 16, julgada pelo STF em 24/11/2010), a Suprema Corte não afastou inteiramente a responsabilidade dos entes estatais tomadores de serviços pela fiscalização do correto cumprimento da legislação trabalhista e previdenciária na vigência do contrato administrativo.

A despeito de o § 1º do artigo 71 da Lei 8.666/1993 afastar a responsabilidade objetiva da Administração Pública pelo simples inadimplemento das empresas contratantes, subsiste, no entanto e em consonância com o STF, a possibilidade de o Estado ser responsabilizado quando, no caso concreto, verifica-se a culpa in vigilando do tomador de serviços a partir de conduta específica da entidade pública. Não se teria adotado, portanto e por via transversa, a teoria de irresponsabilidade total do Estado.

Na verdade, a subsistência, na hipótese, da responsabilidade civil da entidade pública, ajusta-se ao Estado Democrático de Direito e não foi afastada pelo STF, quando evidenciada a culpa in vigilando no caso concreto, pois, dentre os fundamentos erigidos pelo constituinte originário, destaca-se a prevalência dos valores sociais do trabalho, de onde deflui o princípio protetivo do trabalhador nas suas relações de trabalho e o paradigma geral da relação contratual pautada na sua função social e, por consequência, na equidade e boa-fé objetiva.

Oportuno reiterar o registro do Tribunal Regional acerca da culpa in vigilando, no sentido de que:

"Assim, repita-se, apenas a Administração Pública detém aptidão para provar que fiscalizou efetivamente a empresa contratada. E deve fazê-lo, como é óbvio, documentando detalhadamente a relação jurídica em todos os seus contornos. Sem a prova constituída previamente quanto a essa fiscalização, não poderá o Judiciário avaliar se a postura do ente público foi diligente ou negligente, presumindo-se sempre esta em detrimento daquela.

Nessa linha de raciocínio, não se pode exigir do empregado que comprove a negligência do ente público tomador dos serviços, pois significaria exigir prova de fato negativo, tornando praticamente impossível a sua comprovação por parte do empregado.

Compulsando os autos, verifico que a 2ª ré não colacionou qualquer prova acerca da efetiva fiscalização da observância dos direitos dos empregados da empresa contratada, ou de qualquer providência adotada em decorrência do descumprimento da legislação trabalhista pela 1ª ré.

Diante disso, havendo o reconhecimento de débito trabalhistas da empresa prestadora de serviços para com o empregado, é imperioso que a 2ª ré seja responsabilizada subsidiariamente por sua quitação.

Destaque-se que o agir culposo da Administração Pública atrai a responsabilização ampla sobre todas as verbas oriundas do contrato de emprego, nos termos do item VI da Súmula 331 do C. TST, alhures transcrito, inexistindo violação à Súmula 374 do TST." (fl. 969-970).

Tenho convicção de que o encargo probatório não pode ser imputado ao empregado, recaindo sobre a entidade pública que terceiriza seus serviços, por expressa dicção da lei, prevista nos artigos 58, III, e 67, caput, § 1º, 77, 78 e 87 da Lei 8.666/93, 333, II, do CPC, e 818 da CLT. Afinal, se a lei impõe o dever fiscalizatório ao ente público tomador dos serviços, é dele o dever de documentação desse encargo, nos termos do princípio da aptidão para a prova.

Todavia, a 6ª Turma do TST passou a seguir o teor de

recorrentes decisões monocráticas do STF que têm decidido que o ônus da prova recai sobre o empregado, circunstância que, na ótica deste relator, implica exigir do empregado o que a doutrina denomina "prova diabólica", porquanto o trabalhador deverá provar um fato inexistente (a ausência de fiscalização pela remota e indecifrável Administração Pública) ou talvez por meio de documentos comprobatórios que, se existentes, sempre estiveram de posse da tomadora de serviços. Ao princípio da aptidão para a prova, preferiu-se, bem se nota, a presunção de legitimidade dos atos administrativos.

Citem-se como exemplos: Rcl 17578- AL, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Publicação: DJe-148, 31/07/2014; Rcl 19255-RJ, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Publicação: DJe-052, 18/03/2015; Rcl 19147-SP, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Julgamento: 25/02/2015, Publicação: DJe-043, 06/03/2015; Rcl 17.917-RS, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Publicação: DJe-051, 17/03/2015; Rcl 19492-SP, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Publicação: DJe-41, 03/03/2015.

Assim, por disciplina judiciária, ressalvo meu posicionamento, adotando a posição de que o ônus da prova é do empregado.

Partindo-se dessa premissa e considerando que a assertiva regional acerca da inexistência de fiscalização da execução do contrato decorreu unicamente da premissa de não satisfação do encargo probatório pela tomadora dos serviços, a decisão regional que manteve a responsabilidade subsidiária de ente integrante da Administração Pública, incorreu em violação do art. 71, caput e § 1º, da Lei 8.666/93, em face de sua má aplicação, suficientes à determinação de processamento do recurso de revista.

Conheço do recurso de revista, por violação do art. 71, caput e § 1º, da Lei 8.666/93, em face de sua má aplicação.

Mérito

Conhecido o recurso por violação do art. 71, caput e § 1º, da Lei 8.666/93 seu provimento é consectário lógico.

Dou provimento ao recurso de revista para excluir da condenação a responsabilização subsidiária Imposta à EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I) dar provimento ao agravo de instrumento da reclamada EMPREZA CENTRAL DE NEGÓCIOS LTDA. , a fim de determinar o processamento do recurso de revista; II) conhecer do recurso de revista da reclamada EMPREZA CENTRAL DE NEGÓCIOS LTDA. apenas quanto ao tema "natureza do vale-transporte", por divergência jurisprudencial e, no mérito, dar-lhe provimento, para declarar a natureza indenizatória do vale-transporte pago em dinheiro ao reclamante e, consequentemente, expungir da condenação as parcelas decorrentes de sua integração à remuneração; III) conhecer do recurso de revista da ECT, por violação do art. 71, caput e § 1º, da Lei 8.666/93, e, no mérito, dar-lhe provimento para excluir da condenação a responsabilização subsidiária imposta à EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS – ECT. Mantido o valor da condenação.  

Brasília, 15 de maio de 2019.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

AUGUSTO CÉSAR LEITE DE CARVALHO

Ministro Relator

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